sábado, 31 de dezembro de 2011

Para 2012



Ouvir e tocar mais Beatles.

Só.

O resto vem =)

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Onde a reta faz a curva

A fome era tanta
Que comemos
Nosso beijo

domingo, 25 de dezembro de 2011

Natal anárquico



Este ano fizemos diferente. Um risoto de carne seca, damascos, uvas passas, nozes, champagne e canela muuuuito louco, um couscous marroquino com lulas, pimentões, abobrinhas e muuuito azeite. Nada de peru, pernil, tender, presentes, badulaques de natal. Família-philia anárquica, agregados, desagregados, uma apendicite de emergência no meio do caminho...

Uma tal loucura que coleto alguns fragmentos na memória

Descalços na garagem
Abdominais no meio da sala ao som de Talking Heads
Dançando na frente das câmeras do elevador
Uma doce expressão bem pertinho de mim
Promessas inconscientes
... até indecentes!

Amigos queridos, e no cerne, estamos sempre lá!

Na anarquia dos fragmentos dessa vida louca em que tudo que começa tem um fim, este elo forte e querido é para todo o sempre!!!

E que seja só o primeiro desta nova tradição em que fazemos exatamente o que queremos, com quem escolhemos, ao acaso, sem imposições (i)morais!





quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

devaneios iniciais sobre a causalidade e a sincronicidade

Estamos acostumados a observar a natureza e, à partir dela, entendermos o mundo. Portanto, há certos fatos que são causas de outros. Por exemplo, uma coisa queima com o fogo. Congela com a baixa temperatura. Com a água, molha.

Causa... e efeito.

 Como nossa primeira aventura racional, as criancinhas entram naquela fase pentelha do "porque".
"Por que queimou?" "Porque pegou fogo." e instantaneamente passa para níveis que por vezes até nos confundem.

Confundem... pq a relação entre a causa e o efeito em alguns casos é duvidosa.

Mas temos uma mania de enfiar a causalidade em tudo, e sossegamos.
Assim, por que me resfriei? Porque peguei friagem.
Por que o grau da miopia aumentou? Porque não usei o óculos direito.
Por que minha boca entortou? Porque peguei o vento de lado.

Por mais avançadas as pesquisas científicas, sempre existe uma margem de incerteza na validade do complexo causa-efeito em determinadas instâncias. Principalmente se relacionados à estatística.

Aí entra Jung. Se, em uma sala, uma pessoa estiver tirando cartas do baralho e se, em outra, outra pessoa estiver com uma imagem de uma carta na psique, as duas imagens coincidem com maior freqüencia do que é estatísticamente provável.
1. O inconsciente é um domínio de objetos (complexos e imagens arquétipas - fantasia e padrão de comportamento universal do inconsciente coletivo. Portanto, não se pode afirmar que os arquétipos tenham uma natureza puramente psíquica) assim como
2. o mundo real é o domínio de pessoas e coisas.
3. Estes objetos internos do inconsciente afetam a consciência do mesmo modo que as pessoas e coisas.
4. As intuições e pensamentos que surgem do inconsciente, repousam ocasionalmente na superfície do ego (diferente das construções racionais que a consciência adora fazer)
5. Estando os arquétipos no inconsciente, e considerando-no não completamente psíquico, conclui-se que situam-se num contínuo com o mundo físico e externo!!!

De novo, os arquétipos situam-se entre o psiquico e o mundo físico!!!

A sincronicidade é definida como uma coincidência significativa entre eventos psíquicos e físicos (como o evento das cartas do baralho) e, se bem entendi, ligados por arquétipos, cujo evento escapa da relação causal.

Isso tudo para explicar o que não tem explicação. O que ocorre e que vemos como "magia".
Quando "intuimos" e sentimos o que o outro sente.
Quando faz-se uma ligação inexplicável que escapa à racionalidade. E realmente escapa, dado que pertence ao mistério do inconsciente que é ligado sim aos eventos reais.

Como diz M.Stein em "Jung - o mapa da alma": Ingressar no mundo arquetípico de eventos sincronísticos gera a sensação de se estar vivendo na vontade de Deus.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Perpetuum Mobile



Sempre achei que o tempo fosse implacável, que tudo poderia modificar

Mas tem coisa que não muda.
Podemos pintar com outras cores
    aromatizar com flor de laranjeira
        tocar outras músicas

Não adianta.
A melodia central é a mesma.

Desisto.

Sabe, se vc bater na porta da minha casa,
mesmo que ela esteja ocupada,
serei obrigada a abrir

... e deixar que entre =)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

toctoctoctoctoctoc



Existe o TOC (transtorno obsessivo compulsivo) fisiológico, em que as áreas cerebrais acometidas são as mesmas do distúrbio, porém trata-se de um comportamento dito como "normal".

Este TOC fisiológico é permitido como natural entre as mulheres no período puerperal. A sensação de que o bebê é frágil e sucumbirá a qualquer momento, nos deixa enlouquecidas.
Se ele pára de mamar pq se cansou, colocamos a mão na frente do narizinho para ver se ele está respirando
Se ele está dormindo, colocamos a mão na frente do narizinho para ver se ele está respirando
Se ele está acordado, colocamos a mão na frente do narizinho para ver se ele está respirando
Se ele está sorrindo, colocamos a mão na frente do narizinho para ver se ele está respirando

 
C i R C u l A m o S ao redor do bebê. O comportamento obsessivo vai girando e construindo uma redoma protetora ao seu redor. Aparentemente, foi o grande ganho da nossa espécie que conseguiu fazer com que sobrevivêssemos até hj.

Existem ainda duas situações similares. Uma delas é a paixão. Ahhh, que vício! Com a pior das síndromes de abstinência, já que TODOS ao redor hipervalorizam e até acham que o apaixonado é um sortudo - vê se pode! Ainda têm a pachorra de invejá-lo...
Se o cara não responde na hora, achamos que o cara está em outra
Se o cara foi fazer supermercado e não está em casa, achamos que o cara está em outra
Se o cara pára para ler um livro, achamos que o cara está em outra
Se o cara não olha nos nossos olhos, achamos que o cara está em outra

C i R C u l A m o S ao redor do amor. A gente se mata, dilacera, rumina, acaba com o nosso tempo útil para construir uma armadura protetora em torno desta bomba tão frágil... Pq parece que a qualquer minuto pode explodir. E se explodir... só mortos e feridos, ninguém se salva!!!

E a última das situações, o luto. PUTA dor!!!. Coletamos lembranças, fotografias, papeizinhos, palavras, poemas, recados, sons, músicas, cheiros... Por evitá-los, neles mergulhamos. Um redemoinho do qual não conseguimos escapar!!! Gira, gira, em torno daquele ponto maaaaaaiiisss profundo, e que está se afundando e insistimos em rodeá-lo. Uma força incontrolável... Putz, mas se está afundando, por que mergulhamos?
Pq foi bom. Pq a ele nos apegamos demais. E pq insistimos em alimentá-lo para que sobreviva...


AINDA bem que a medicina avança! A ressonância magnética, os neurotransmissores, isso tudo que comprova o TOC fisiológico e dele consegue, quando convém, nos tirar...

... e viva a medicina!!!!!


     

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Sintonia



Incrível como, quando sentimos uma conexão, ela realmente existe.

Evidente que por vezes estamos fora de sintonia com o outro, 
ou melhor, 
entramos em sintonia com uma massa que sufoca a real percepção daquela pessoa em especial...

Mas geralmente, um olhar lúcido detecta qualquer movimento harmônico.

Eu não sei por que é mais fácil deixar para lá do que esclarecer...
verificar se a música rolava mesmo.
A gente tem uma mania de achar que só foi importante para nós.
Uma mania de achar que não passamos de uma pulga para o outro.
Um alguém a mais.

Acho que só temos a ganhar quando conseguimos, 
enquanto ainda é tempo, 
esclarecer e viver o que nos traz aquele sorriso nos lábios, escrachado ou tímido...
Aquela alegria só por ela,
sem pensar no que será dos outros dias ou das possíveis tempestades,
ou o que deveria ser ou fazer para harmonizar tudo no seu devido lugar.


O que não é mais permitido!
Ficar com aquele nó na garganta ao saber, 
quando já não dá mais, 
que aquela sintonia fina e especial sempre existiu.



 

Assim, é tempo de  M E R G U L H A R !!!!

Se a água estiver gelada... basta nadar rapidinho que o corpo esquenta =)

domingo, 11 de dezembro de 2011

Uma questão de gosto

Neste domingo de calmaria, estava folheando uma revista bem cuidada, imagens coloridas e bonitas, gente elegante... anúncios de produtos para poucos. Dentre eles, um relógio de pulso (alguém ainda usa relógio de pulso?) bonitão, cheio de números, lembra daqueles beeeem tradicionais: Patek Philippe "considerada a marca mais artesanal por ter em congruência uma filosofia desafiadora e inovadora. Não é à toa que alguns de seus modelos estão entre os mais cobiçados. O Platinum World Time é um deles. Foi desenvolvido em 1946 e vendido apenas em 2002. Feito de platina, indica diversos fusos horários por um custo de 6 milhões de dólares". Capice?!?!?! 6 milhões de dólares!!! De pronto me lembrei que essa era das cifras mais elevadas do meu imaginário infantil



Ele era mais forte... mais rápido... super-visão!!! Atributos únicos por 6 milhões de dólares.
São únicos "igualmente" aqueles que compram um Platinum World Time "artesanal e de uma filosofia desafiadora e inovadora".

Uma loucura por se diferenciar dos outros. "O melhor dos iguais" - como o título de um dos álbuns do Premê


Relógios Patek Philippe, bolsas XYZ, sapatos ZYX, citações no facebook, vomitadas de conhecimento rápido wikipedia, leitura das resenhas dos livros, filmes por traillers ou críticas de jornal... leitura de jornal novelescas... camisetas com estampas desde "Armani" a "WWF"

Para manifestar um gosto. Uma questão de gosto... Como será que apareceu?

De acordo com Flandrin, na História da Vida Privada, "A distinção pelo gosto", o "Bom gosto" foi inventado no século XVII. Com a queda aristocrática, o berço, a riqueza e o brilho da nobreza poderiam ser comprados pelos burgueses. Consumia-se o luxo. As diferentes classes poderiam se comunicar - e se confundir!

Ah, mas a aristocracia tinha "bom gosto"... Só um paladar aguçado, de berço, permitiria apreciar uma iguaria. Isso estendeu-se às artes. Assim ele aparece como a primeira "virtude" social que relacionava a interioridade (o gosto) com a aparência. E assim, o gosto demonstrava um modo de distinção social.

A parte em que o gosto reflete, na aparência, o que o indivíduo sente e como ele se relaciona com as coisas, é legítima. É bacana.
O problema é quando se deseja ter uma aparência distinta dos outros e, à partir da aparência desejada, moldar o próprio gosto. Aparência de intelectual, ou de alternativo, ou de quem tem berço, ou de burguês (olha só como as coisas mudam!)... Quando se quer ser igual aos melhores. Completamente ilegítimo e indecente. Usar uma bolsa reciclável fashion e fazer questão dos saquinhos de supermercado para colocar na lixeira, pode ser tão indecente quanto usar um relógio Platinum World Time. Assim como casar na igreja com uma puta festa e gostar de se dizer ateu (intelectual tem essa mania).

Comprar uma distinção social e se render à vida besta.

Ai que náusea...

sábado, 10 de dezembro de 2011

Kairós


E se eu te abraçasse com ternura, te olhasse nos olhos e te dissesse que é o homem da minha história?
Que desde a primeira vez que te vi, me senti em casa?
Que quando te vi dormindo ao meu lado, acariciei teu rosto e incrivelmente não vislumbrei o fim...

Por que será que não o disse?
Medo. Sempre antecipando o fim. Mania de desmerecer o futuro...

Mas a mesma verdade que eu presenciava nos teus braços é a que sustenta uma plácida lucidez de que a força destas palavras encontrará o caminho certo. No tempo certo.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Presentão!

De uma querida amiga,

4 Cantos "Brasil Pandeiro" from Zapipele Filmes on Vimeo.

Para colorir mais uma 6f chuvosa... Só o samba salva!

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Mr. and Mr. Smith

Conheci X numa balada. Um fofo, querido demais.
A empatia foi imediata e passamos um tempão conversando sobre tudo... na verdade, conversando sobre o que mais aflige a natureza humana de uma mulher e de um gay: homens!!!
X estava louco para casar.

Passou-se um tempo, e o encontrei com Y. Um casal gracinha. Sorridentes, educados, parceiros.
A empatia foi imediata e passamos um tempão conversando sobre o que mais aflige a natureza humana: casamentos rsrs
Sim, estavam casados! Em menos de 1 mês, X foi morar com Y. Estavam em lua de mel...

Encontramo-nos de novo no carnaval...
Eu, sempre no mundo da lua... mas me lembro de algumas cenas:

Y nos levava para jantar, para conhecer tudo que é lugar
X sorria para todo mundo
X sumia...
Y desesperado atrás dele

De novo, cruzei com eles por aí. Enquanto dançávamos, eles se perdiam no meio das "almôndegas" de gente. Um labirinto de pernas, braços, mãos, línguas...
Experimentações...

E ontem... decidindo sobre nossa próxima aventura...
X: "Não dá mais... Ele é muito controlador. Comigo não rola. Ele é incrível, adoro-o, mas está muito fragilizado... Estou dando um tempinho para que melhore e consigamos sair desta bem."
Y: "Estou passando por um momento tão difícil... Eu tenho uma cabeça aberta, mas ele mora na minha casa e traz os casos dele aqui! Já conversamos, mas não adianta. Ele é uma graça, adoro-o, mas precisa arranjar outro lugar para ficar. Estou dando um tempinho para que se arranje e consigamos sair desta bem."

A cada toque do telefone, "quem era?" A cada nome suscitado na mesa, "quem é?"
E o olhar desesperado...
aquele que deseja encontrar o que se perdeu.
aquele, servo, que busca no olhar do outro o brilho que não mais lhe pertence...

Comportamento legítimo. Mas não é digno...

O luto é cruel, sim. Péssimo. Daqueles que não se quer mais enfrentar nesta vida. Mas necessário...
Há que se ter dignidade para conservar nossa integridade.

Deixar partir.

Queridos, "Cuide-se!"

domingo, 4 de dezembro de 2011

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

A whole new world

Ainda me lembro de quando estava para prestar o vestibular para medicina, e de repente veio uma dúvida quanto à escolha da carreira...

Isso costuma acontecer. A estabilidade do "pra sempre" sempre deixou-me estarrecida.

Até hoje guardo com carinho uma conversa que tive com um professor querido nos banquinhos à frente do Anglo. Quando eu dizia tudo que queria fazer e conhecer, sentia-me flutuar nas minhas palavras que se propagavam pelo mundo real e imaginário, até perder-se de vista... Eu me sentia no tapete mágico que meu pai descrevia enquanto tentava nos fazer dormir. Da minha cama quentinha, sobrevoava locais conhecidos e desconhecidos no silêncio da noite: escola, a chácara, a casa dos meus primos... e meu pai era ousado! Montados no tapete tecido por suas palavras, chegávamos à lua, aos planetas do sistema solar, ao universo!!! Acho que daí veio essa minha vontade de percorrer este mundão infinito montada na segurança das minhas palavras...

Aí o meu professor disse: "mas vc quer abraçar o mundo com o dedo mindinho?"

Ele bem estava certo. Em parte. Os pés precisavam de chão. Lembrava-me de que o gostoso não era estar flutuando no tapete mágico. Gostoso era fazer isso no aconchego da cama quentinha e fofa.

Saí da conversa decidida! A primeira das escolhas, por minha conta e risco. Mergulhei naquele mundo biomédico, cada vez mais específico. Nele há sim, um leque de opções ainda. Mas sentia que eram variações sobre o mesmo tema. A cama quentinha já havia sido conquistada. O tapete... passeava nos caminhos previsíveis.



Eu precisava de AAARRrrr. Aquela sensação boa das histórias de dormir pelas palavras do meu pai, oprimia-me cada vez mais...



Uma frestinha da janela se abriu e pulei! Eu me lembrava de outra frase do meu professor querido: "nenhuma escolha é definitiva. Se não der certo, oras, volte atrás!"

O que percebo hoje em dia... Mesmo as escolhas que julgo equivocadas movimentam-me. Ou seja, se aparentemente uma porta se fecha, isso nos permite olhar para os lados (esse passo é fundamental!). Se nos mantivermos atentos a tudo que não é aquela porta que se fechou, descobriremos um mundão enorme (ok.. esse passo também é fundamental!)



É impressionante como percebo que, a cada escolha, o que apreendemos preenche ainda mais aquela caminha confortável. Este sossego e talvez lucidez são combustível para identificar um número cada vez maior de "portas abertas". E voltamos a escolher em qual entrar. Não se trata de uma busca desesperada pelo novo. Trata-se de uma plácida lucidez que nos permite manipular com rapidez e eficácia nosso olhar em grande angular e zoom.
Deliberar...
E escolher.

Sem medo nem preguiça, como sugere Kant.
Atento ao kairós, como sugere Foucault.

"Encarnamos" assim uma dimensão livre e autônoma que nos traz a segurança para abraçar um mundo ilimitado e ousado, como aquele que meu pai nos apresentava.

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Coca Zero

Por vezes, temos a sensação de que cortaram a luz no meio da projeção de um filme. A gente tem uma mania de atribuir significados, inventar e fantasiar o fim... Para ver se consegue adoçar um pouco o gosto amargo da ausência.

No começo, é a única alternativa para não amargar a vida inteira. Passo a passo, acreditando no tempo como aliado, acostumamos com o gosto do adoçante na vida. Adoro uma coca zero!

Mas, sei lá, aquela vontade de saber o fim da história nunca termina...

Chegando no fim da vida adoçada, o fundinho amargo pode ser outro.
O de ter se deixado iludir pelo tempo - tô falando que ele é traiçoeiro...
E não ter aproveitado todo o doce sabor da vida.

domingo, 27 de novembro de 2011

descarnados

http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-62/ficcao/divorcio

Tempo traiçoeiro

Tento agora canalizar esse mundo que no momento paira sobre mim. Uma certa saudade de quem via nos corredores, nas festas, nas salas de aula. De quem eu só era capaz de sentir a presença. Nada mais. E porque nem me permiti. Sempre deixava "para a próxima vez". Esse é um vício torto mesmo...

Uma presença leve, feito passarinho. Artista, poeta, sensível, doce de mel...

Acordei naquele dia e deparei com canções lindas... e pedi lincença para compartilhar:

toda licença poética é mto bem vinda = ) faz parte duma parceria entre a hilda hilst (com uma série de poemas sobre Ariadne e Dionísio) e composição musical do zeca baleiro (Ode Descontínua para Flauta e Oboé), com mais ná ozzeti, monica salmasso, bethania....... afe! quedo-me silente......



Uma alma tão doce... Guerreira, de quem saiu da casa cheia de verde, cantos de passarinhos, cheiro de flor...

"Na nossa casa amor-perfeito é mato
E o teto estrelado também tem luar
A nossa casa até parece um ninho
Vem um passarinho pra nos acordar 
Na nossa casa passa um rio no meio
E o nosso leito pode ser o mar

A nossa casa é de carne e osso
Não precisa esforço para namorar
A nossa casa não é sua nem minha
Não tem campainha pra nos visitar
A nossa casa tem varanda dentro
Tem um pé de vento para respirar"
Arnaldo Antunes

... e veio estudar na cidade grande cinza, barulhenta, cheia de trancas e medo - e como é difícil, bem sabemos.

O que será que se passou...

Talvez eu saiba. Talvez um dia tenha vivenciado tudo isso. Por vezes parece que o momento em que estamos é só um momento. Que o outro será melhor. Como aquela pipoca de saquinho rosa - a gente sempre espera uma mais crocante e doce, e sabemos que virá. Quanto mais jovens, mais acreditamos na quantidade de pipocas porvir. A morte talvez fosse mais crocante e doce do que o gosto sem gosto que estava na sua boca...

Mas o que mais amarga o gosto na boca, é a distância que nos impôs. Impossibilitar aquela vontade que eu tenho de ligar e me encontrar com vc, ver seu sorriso doce, e dizer como me encanta. Mesmo sabendo que, se estivesse por aqui, continuaria "deixando para depois". Por que deixo de falar com quem gosto, com quem realmente vale a pena cada encontro, neste momento em que tenho vontade?

Por que sempre achamos que o tempo é nosso amigo?

De certo, ele é traiçoeiro... Rouba-nos o melhor - o presente momento.

"afe! quedo-me silente..."


terça-feira, 22 de novembro de 2011

Intolerância

Há alguns anos atrás, na época das grandes navegações, qual não foi a surpresa em se encarar um outro tão diferente, vestindo-se de modo completamente diverso, inserido numa natureza que feria os olhos de tão verde e ensolarada... Não ser o centro do universo já foi difícil de aceitar. Que dirá do "outro": mesma espécie - homo sapiens - mesmas necessidades, e TANTAS diferenças... Como poderia ser? Como o outro poderia viver bem, sendo tão diferente? As aferências eram tantas, tantas informações, tantos focos, que acabavam ofuscando o que se enxergava.

Desta época, encontra-se já na "Encyclopédie" ou dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers um verbete sobre a Intolerância:

"...entendida comumente como essa paixão feroz que leva a odiar e a perseguir aqueles que estão no erro. 
(...)
Todo meio que excita o ódio, a indignação e o desprezo é ímpio
Todo meio que desperta as paixões e que nelas tem objetivos egoístas é ímpio
Todo meio que afrouxa os laços naturais e afasta os pais dos filhos, os irmãos dos irmãos, as irmãs das irmãs, é ímpio.
Todo meio que tende a sublevar os homens, a armar as nações e a molhar a terra de sangue é ímpio.
É ímpio querer impor leis à consciência, regra universal às nações. É preciso esclarecê-la e não constrangê-la.
Os homens que se enganam de boa fé são para lastimar e não para punir."

Muito bem. Vamos respirar fundo. E procurar então o verbete sobre a Tolerância:

"... é a virtude de todo ser frágil destinado a viver com seus semelhantes. O homem, tão grande por sua inteligência, é ao mesmo tempo tão limitado pelos seus erros e por suas paixões...
(...)
... como a razão humana não tem uma medida precisa e determinada, o que é evidente para um é frequentemente obscuro para outro. (...) De onde se segue, que ninquém tem o direito de dar sua razão por regra, nem pretender submeter ninguém às suas opiniões."


Incrível como, passados alguns fatos e outros tantos atropelos, voltamos ao mesmo ponto. Ainda nos obrigamos a nos encher de opiniões. Em um mundo recheado de informações rápidas - ninguém mais tem tempo para entender nada - basta que uma ou outra informação chegue aos nossos olhos ou ouvidos para emitirmos uma opinião.

Quanto mais polêmica, melhor. Ou, quanto mais carregada de paixão, melhor.

Será...

Que o cotidiano é tão vazio, tão mecânico, que necessitamos de algo que nos suscite o afeto?

A rotina engoliu o afeto!

Perdidos na trilha certa, desesperados em busca de qualquer informação que o traga de volta... Nem mais importa se atropela o outro.




De novo, uma pena...

Um desperdício de humanidade...

domingo, 20 de novembro de 2011

A insustentável leveza do ser

"para mim, uma escolha nunca é final: está sempre sendo feita (...) O horror da escolha definitiva é que envolve não só o eu de hoje, mas também o de amanhã, razão pela qual fundamentalmente o casamento é imoral."

Simone de Beauvoir

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

A fidelidade...

"Agora me vou, mas fique sabendo, Catierina Ivánovna, que a senhora realmente só ama a ele. E o ama tanto mais quanto mais ele a ofende. Eis a sua mortificação. A senhora o ama precisamente tal qual ele é, ama-o sendo ofendida por ele. Se ele se emendasse, a senhora o largaria imediatamente e deixaria de amá-lo de vez. Mas a senhora precisa dele para contemplar constantemente sua façanha de fidelidade e censurá-lo por infidelidade. E tudo isso movida por seu orgulho. Oh, há muito de rebaixamento e humilhação aí, mas tudo isso vem do orgulho..."
F. Dostoiévski - Os Irmãos Karamázov

Olho para a ficha, chamo o Sr. João, 70 anos. Levanta do sofá da sala de espera... cabisbaixo... Logo a Sra. Maria, lépida e olhar severo, se adianta e me cumprimenta primeiro. Adentram à minha sala e se sentam à minha frente. Atenta, escuto a Sra. Maria. Pergunto ao Sr. João o porquê da visita. Ele abre a boca, insinua o movimento laríngeo para a emissão da voz... e novamente é a Sra. Maria quem me responde. "Ele não passou no exame médico para renovar a carteira de motorista. Eu disse para ele para passar com a senhora antes, mas... e ele me escuta?"

Diante daquela nuvem inesgotável de palavras, enxergo o album de fotografias e os porta-retratos espalhados pela casa. Maria, distinta, recatada, exemplo de mulher. Trabalhadeira, dedicada aos seus, amorosa, olhar doce e acolhedor. Incapaz de perambular pelas sombras. Ahhh... a mãe ideal para os filhos.
E vem João, cheio de vida, adooora um papo, bebe... socialmente (uma breja sempre vai bem, né?), e o olhar brilhante que caça qualquer movimento, segue cada suspiro inesperado. "Tanta beleza nesse mundo... mas, mais bela é minha formosa Maria, moça de família... moça para família..."

À cada caça, João retorna para Maria - é seu porto seguro!
À cada caça que Maria fareja em João... o olhar abaixa. Mas mantém a altivez! Mantem a "dignidade".

À cada caça, João retorna para Maria - ela o ama de verdade! Nunca o largaria...
À cada caça que Maria fareja em João... o asco. Mas mantém a altivez! Realça sua conduta impecável! Pode ser severa: encontra-se acima de qualquer suspeita! Adquiriu direito de julgar! - Mas nem percebe o preço a se pagar:  sua Dignidade

Chega o momento em que João se rende. Qualquer olhar é repreendido. Pela lembrança severa e "digna" de Maria.
Finalmente Maria se encontra acima de qualquer um.
... acima da pisoteada Dignidade.




quinta-feira, 10 de novembro de 2011

A paixão pelo amor



"A impossibilidade da plena realização do encontro amoroso, que o percurso dos amantes indica, teria que ser entendida já como um extravasamento, uma excedência que os faz, mais do que se amarem um ao outro, serem presas do amor, "o amor do amor", num grau de narcisismo para além do espelhamento pessoal. A situação dos amantes é apaixonadamente contraditória: eles se amam mas não se amam , sentem-se arrebatados para além do bem e do mal numa espécie de transcendência das nossas condições comuns, num absoluto indizível incompatível com as leis do mundo, mas que eles sentem como mais real que este mundo. O que os liga de modo indissolúvel é uma "força estranha", "tormento delicioso" que opera no estranhamento e na fusão dos contrários. Transportados, entusiasmados, endeusados pela paixão, drogados de si e do outro, o que eles amam é o próprio ato de amar, o amor em si, e tudo o que se opõe a isso o exalta ao infinito (no instante do obstáculo absoluto que é a morte)."

José Miguel Wisnik - A paixão dionisíaca em tristão e isolda - Os Sentidos da Paixão


A vivência da vida
e da morte de muito perto
O que pode ser mais intenso que uma vida inteira, para além dela sob a luz do dia
E mais arrebatador que a morte, quando a lua nos abandona

Por um amor sem corpo... sem lugar para ser... sem estar para se consumar
e que por isso nos levava além do bem e do mal
equilibrávamo-nos na tênue linha entre o possível e o perigoso
onde não há distinção entre
certo ou errado
quente ou frio
dor ou prazer
em que a morte é só um lugar.... diferente daquele que nos repelia

Ilimitado... impulsionava-nos ao infinito - lá, só lá situava o nosso amor

Já nem sabíamos o que carregar... 

Ao mergulhar na insegurança do teu olhar, um punhal no meu peito abriu espaço para sugar o teu breu. O abismo encheu meus pulmões e eu não conseguia expirá-lo. Uma tremenda falta de ar me fez pular da tua cama e correr para a janela.

Não vi a lua
nem luz nas janelas
nenhum sopro de voz
só vácuo...

Quis fugir dali, correr muito, voar para... para onde? Como? Estava sempre com frio, cheio de espinhos, vazio... o corpo estava sumindo... cada vez mais leve... as mãos nas tarefas, e o olhar ausente... Naquele momento, atemporal, embebida pelo infinito, a morte era só um lugar, talvez, melhor...

A vida, que nunca me abandonou, me resgatou!
Presenciou-me. 
Engoli tua dor...
e parti.

Nada! nada pode ser mais Belo...

"O mundo é pobre para quem jamais foi doente o bastante para essa 'volúpia do inferno': é permitido, é quase obrigatório usar aqui uma fórmula mística. [...] e, sendo assim como sou, forte o bastante para ainda tirar vantagem do mais problemático e perigoso e com isso tornar-me mais forte, denomino Wagner o grande benfeitor de minha vida" 
Nietzsche - Ecce Homo



segunda-feira, 7 de novembro de 2011

L e V i T a R


É uma fissura!
Sabemos da explosão de prazer, ela fica na memória encarnada no nosso corpo. Qualquer sinal de presença dispara o gatilho. Aí a razão se perde e não nos encontra, vem o arrepio e começamos a pegar fogo!

Aquela loucura em que não comandamos mais nossos movimentos

Não sentimos mais os corpos, o peso, as sensações estão todas concentradas naquele calor e são elas que nos movimentam...

c    o   m   p a   s s  a doSsiNcRôNiCoS

!!!!!
..
.
.



Estarrecidos, agora um ao lado do outro...

L   e  V  i   T   a  N  d   O

"Estou no ar..."

Aí te (me) encontrei!

Naquela clareira
rodeada pelo breu da floresta cerrada que silencia qualquer sorriso,
Naquela clareira
onde as copas das árvores gigantescas amenizam a luminosidade impertinente

Uma percepção extrasensorial, irracional,
que impregna no meu ser...
... na memória do meu corpo

Não se preocupe,
não sai!!!

sábado, 5 de novembro de 2011

Traquinagem


Tá de sacanagem comigo?

Quando penso que enfim chegou o verão,
esse frio invernal me subtrai
e me leva novamente ao outono?

As folhas, amarelinhas, na calçada da minha rua...

Que esse tempo siga seu curso!

Comme il faut
.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Vôo solo



 "Ah, só pode sair de nós quem nunca possuímos. E não podemos nem sequer lastimar o fato de nunca termos realmente possuído este ou aquele: nunca teríamos tempo, nem força, nem justiça para tanto. Pois a mais momentânea experiência de uma posse real (ou de uma comunhão, que é, de fato, posse dupla) nos lança com tal ímpeto de volta a nós mesmos, nos dá tanto o que fazer aí, exige tanto desenvolvimento solitário de nós, que ela bastaria para nos ocupar como indivíduos para sempre"

 Cartas do poeta sobre a vida - R.M. Rilke

domingo, 30 de outubro de 2011

Belo filme


Um dia me disseram que um bom relacionamento só é possível com alguém que consiga terminar bem.

Como terminar bem? Se um dia foi tanto, grandioso, que conseguiu com a ternura e a leveza, derrubar todos os pilares de uma arquitetura com a qual estava habituada já no meu DNA...

Teus lábios aqueciam meu corpo,
dissolviam-se as crostas...
as camadas de tinta ilusória
os remendos grosseiros postos para continuar...

Que penetrasse cada vez mais fundo,
e quebrava todas as convenções
as impressões
o mundo pré-fabricado

Deslizava
desvelava
encontrava a alma justa

Assim se fez
assim nos fizemos
Pincelamos nosso mundo
vasto mundo

A cada encontro, uma explosão de som, cores e aromas

e um medo que tudo se acabasse...

muito medo

Mas, sabe,
foram essas pinceladas justas que nos expulsaram daquilo que nos consumia,
aquela enxurrada contra a nossa natureza

Como fogos de artifício,
estraçalharam nosso brilho
Uma dor difícil de aguentar
faltava-me o ar, e até hoje falta.

eu pensei que só restassem cacos

mas cada peça resgatada
consegue ser ainda mais Bela

Querido, acho que estou me redesenhando com traços firmes

e Bons

Um jeito justo de terminar uma bela história

=)

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Leaving on a jet plane

Na pressa de arrumar as malas
Acho que deixei o tesão e sonhos que tivemos juntos na tua cama...

Aproveite-os!

Tem pra mais de encarnação =)

Montanha russa

entre o esgoto e o paraíso

não vejo a hora de ver o céu!

- Tem atalho?

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Experiência limite

...e continuo a sonhar com ele assim, uma espécie de vento que faz estourar as portas e as janelas... Meu sonho é que ele fosse um explosivo eficaz como uma bomba, e bonito como fogos de artifício.


Michel Foucault - História da Loucura


E quando
experimentamos uma vivência assustadora
que abala as estruturas do senso comum

em que arregalamos os olhos para procurar
entendimento onde não há

aquele ponto mais próximo do invivível...
... do insuportável

aquela que nos impede de ser
... nós mesmos

aquela que nos ultrapassa, deixa para trás
aquele que conduzia a sinfonia

aquela em que perdemos a identidade
... dissolvidos, dessubjetivados, desestruturados

expõe e desmonta nossas ferramentas

o limite,
a ponta da experiência que se faz abismo

a força explosiva
como operadora
da nossa reinvenção,
do pensamento
do mundo

Aí sim vai de encontro ao sol!



A paixão







è un venticello,
un'auretta assai gentile
che insensibile, sottile,
leggermente, dolcemente
incomincia,
incomincia a sussurrar


Começa pequenininho. Pura diversão. Gostosa lembrança que nos chega quando permitimos - num momento em que, cansados das tarefas, suspiramos e desviamos o olhar para o além. Confortável, não atrapalha nossos afazeres, por vezes pincela o cenário com umas cores bacanas!





Piano piano, terra terra,
sottovoce, sibilando,
va scorrendo, va scorrendo
va ronzando, va ronzando;
nell'orecchie della gente
s'introduce,
s'introduce destramente,
e le teste ed i cervelli,
e le teste ed i cervelli fa stordire,
fa stordire e fa gonfiar.


Pouco a pouco, traiçoeiro, vai se infiltrando nos nossos giros cerebrais, invade e cava devagarzinho o estômago, atiça o sistema adrenérgico quando toca o telefone... e viciamos naquela endorfina que vem depois...

Mas tudo bem! O autocontrole é tanto e tão confiável que restringimos sua decretada importância ao espaço adequado. Não informamos aos pares... Não aparece no facebook... Não colamos na nossa testa! Para o mundo pragmático, NÃO EXISTE!!! Fácil fácil... se for negado, nem interfere na nossa vida.





Dalla bocca fuori uscendo
lo schiamazzo va crescendo
prende forza a poco a poco,
vola già di loco in loco;
sembra il tuono, la tempesta
che nel sen della foresta
va fischiando,
brontolando, e ti fa d'orror gelar.


Com a troca de seivas, saliva, e a sede de desvendar cada vez mais o outro, já que cada verso é o mundo, e cada estrofe uma sinfonia, não suporta o espaço devido. Uma tempestade que grita, exigindo mais e mais espaço.

E amedronta... Apavora!!!

Tem-se a sensação de que ainda está sob controle porque não permitimos (uhh, doce ilusão) que invada os outros espaços: status de relacionamento: SOLTEIRA!!!!!

Mas pouco a pouco...

Percebemos que estamos vivendo pela metade. Metade no espaço social, e metade no espaço que nos abduz, aquele dos extraterrestres, lunáticos mesmo.





Alla fin trabocca e scoppia,
si propaga, si raddoppia
e produce un'esplosione
come un colpo di cannone,
come un colpo di cannone.
Un tremuoto, un temporale,
Un tumulto generale
che fa l'aria rimbombar!
E il meschino calunniato,
avvilito, calpestato,
sotto il pubblico flagello
per gran sorte ha crepar.


Este amor poderoso e exigente (quem dera fosse uma calúnia...) não dá aviso prévio antes de explodir. Se não somos perspicazes o suficiente para abrir caminho para que ganhe corpo naturalmente... Transborda e estoura!!!

Ficamos em frangalhos... Espalhados para tudo que é lado. Parte aqui, parte acolá...
Todas as defesas: restringir seu lugarzinho, para-quedas, plano B, banco de reservas...

Cadê mesmo?

Mas tá tudo bem! A gente transforma em arte - a vida, afinal. E prosseguimos nos transformando, tornando-nos uma grande obra de arte...


P.S. Lembrei-me desta ária do Il barbieri di Siviglia - La calunnia è un venticello. O caminho é muito semelhante. Talvez por conta do medo que se ampara na razão.














sexta-feira, 21 de outubro de 2011

De Rilke para Lou Salomé

   

     "Ao novo medo sucede uma nova felicidade. Sempre foi assim.
      Apenas é necessário que vcs aprendam a crer; é preciso que se tornem piedosos em um sentido novo. Os anseios precisam estar acima de vcs, onde quer que se encontrem. Imprescindível é que os agarrem com ambas as mãos e os exponham ao sol, onde é maior a sua bem-aventurança; porque estes anseios precisam recuperar a saúde.
     Se ainda existirem temores ou dúvidas em suas almas, rejeitem ambos e não os levem em conta. Mesmo que avultem em seus caminhos: haverá sempre montanhas erguendo-se diante do passado.
     Como admirei em ti, minha querida, esta confiança despreocupada em todas as coisas, esta bondade que não conhece o medo. Agora esta confiança também vem se apoderando de mim, por um caminho diferente. Sou como uma criança que estava suspensa à beira de um precipício. Sua aflição e seu sofrimento se aliviam quando a mãe a segura com força amorosa e tranquila, mesmo que o abismo ainda esteja sob os seus pés e os espinhos se interponham entre sua face e o regaço materno. Ela sente-se amparada, erguida - e está confiante.
     Como anteriormente falei de Giuliano dei Medici: virá a época em que ninguém será vencido pelo destino, antes de ter produzido frutos. Virão os dias da colheita. E cada um ouvirá as canções com que presenteou a amada despertando nos lábios da mãe que acalentará o seu filho. Virão os dias da colheita.
     (...)
     Ah, se eu pudesse dizer a todos que época será esta! Magoa-me tanto que muitos vivam sem alegria e sem esperança. Gostaria de ter uma voz como a do mar e ser, ao mesmo tempo, uma montanha que se ergue na claridade quando rompe o sol: para que eu pudesse despertar a todos com a luz, sobrepujá-los e chamá-los.
     (...)
     Lou, ao ler estas linhas, sinto-as como se fossem um hino. E anseio o momento em que as lerei na tua presença; aí elas receberão a melodia.
     Preciso apenas de forças. Todo o resto, eu sei, está em mim, para que eu me torne um pregador. Não tenho a intenção de peregrinar por todos os países, tentando difundir o meu ensinamento. Aliás, não desejo que ele se solidifique e petrifique em uma doutrina. Quero vivê-lo. Desejo apenas, querida, peregrinar por tua alma, percorrê-la até o âmago, até o lugar onde ela se torna um templo. E lá quero erguer a minha nostalgia como uma custódia, que há de se elevar até a tua magnificência. Este é o meu desejo.
     Tu me viste sofrer, e tu me consolaste. Sobre o teu consolo construirei a minha igreja, na qual a alegria terá altares luminosos.
     Talvez eu ainda não seja predestinado a ver o verão que, como sei, há de vir. Talvez eu próprio possua apenas a força da primavera, apesar de tudo. Mas tenho a coragem de ansiar o verão e a fé na felicidade perfeita."
O Diário de Florença - Rainer Maria Rilke

... para "Rilke para Lou Salomé"

Te cuido
... embora sempre se perturbe com meus olhos de Capitú

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Romântica

Ah...
Por vezes ficamos assim, né? Afinal, o que difere as grandes estórias das cotidianas, é o sentido que damos aos fatos.

As pontes floridas entre os fatos casuais.


Deste modo,

"E como escreveu Platão, os andróginos eram seres poderosos, redondos, duas cabeças, quatro braços e quatro pernas, tipo gêmeos siameses. Talvez fosse assim o mundo da plenitude. Talvez monótono, já que não havia angústia... Talvez sem ruído, já que ele se bastava. Talvez sem festas, ruas vazias, fins de semana de parques desertos... Mundo externo monocromático e interno extremamente colorido... Sem graça, muito sem graça.  

O tédio incomodava o grande diretor do filme. Não havia histórias para contar, nem desgraças para vibrar, nem paixões para se invejar. Como Zeus, resolveu partir o andrógino em dois, desmemoriá-los e encaminhá-los ao mundo que conhecemos. Mas a amnésia não era total – se assim o fosse, o novo mundo voltaria ao marasmo, novamente não haveria a falta. Caberia aos órgãos do sentido, e somente a eles, a ‘lembrança’ da presença da outra metade. E a sensação de plenitude só poderia decorrer do preenchimento máximo destas lembranças - ou para alguns desesperados, suficiente. Assim, o caminho pela busca seria longo, cheio de enganos e atropelos e cheio de histórias para contar..."
;)

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Ain't no mountain high enough



 Essas palavras não se encontram no som ao fundo. Destoam. Como o que nos tira do eixo. O que nos arrebata. E tudo que contrasta com o cotidiano, agride. Força, cutuca, provoca sempre que tentamos adequá-lo à realidade.




"This is art of earn
Gifts given only
to those who
head out past the
No Entry signs"



from "OUT OF SIGHT - Urban Art/ Abandoned Spaces"


Quando... 
tem-se a coragem de se deixar levar pelo desejo, perpassamos os sinais de "No Entry" e cambaleamos a razão...
Razão que se defronta... e se rende à esta arte tão sublime e delicada, que leio nas palavras, desenhos e músicas que registrou e me presenteou embrulhados nos acontecimentos provincianos de um dia que passou.

As explicações, os motivos, o sentido que encontrei em voltar aos trilhos para me proteger... apavoram-se diante da nossa arte. 

Urbana. 

e que se limita aos espaços abandonados. Aqueles que a nada se pretendem. E que tudo podem ser.

Podem... se quiserem.

domingo, 16 de outubro de 2011

Penso, logo, existo

No meio de uma confusão de saberes, num caldeirão efervescente de idéias e certezas advindas de vários pontos de vista, já nem se sabia mais o que era certo e o que era errado. Descartes então teve uma idéia! Resolveu derrubar o mundo inteiro ao redor. E percebeu... que a única coisa que restava era a dúvida.

O pensamento...

Ao ter a certeza de que pensava... concluiu que existia!

Deste modo, a primeira certeza é o pensamento. A razão. Ou seja:
1 - penso
Só à partir desta certeza,
2 - existo: cabelos lisos, olhos castanhos, trabalho, corro qdo não chove, detesto fígado acebolado, adoro fungi...

Ou seja, a razão é a premissa. E a existência, mais um predicado, uma qualidade, como o  branco dos olhos...

Aí escutava num bar: "ahh ele é demais! Adora animais, é empresário, bom nos esportes, curriculum lattes enorme, tocou violoncelo para mim, elegaaaante, um bíiiiceps... Já foi para tudo que é parte do mundo, até para Capadócia!!!!" Ela estava apaixonadinha... pelas qualidades, que não eram poucas!

Passou-se um tempo, no mesmo bar, os mesmos personagens... Quanto às características citadas... quem sabe o branco dos olhos? Como pode mudar tanto assim em tão pouco tempo?????

Talvez...

Não se possa confundir a existência como mais uma qualidade. Faz-se uma somatória, coloca-se numa balança, se a maioria das qualidades não presta mais, igualmente o amor não mais existe. Isso é fato. Mas a relação não é simples assim, e nem a explicação é pertinente.

A existência precede inclusive o pensamento. A existência é a premissa!!!

Deste modo, a percepção do Ser escapa da razão. Se o ar te falta, fico dispneica. O arrepio começa na minha nuca e corre pelo teu corpo. Chove por aqui e tua alma inunda. Inicia um pensamento, e ele corre nas escadarias do Escher, infinitamente e com gravidade zero. Minha força é tua. Teu sofrimento é meu. O silêncio é todo potência, como o que encontramos na tranquilidade da mais absoluta solidão.
Trata-se da percepção ontológica do Ser.
Garantida a existência, as características acrescentam, mas no fundo, menos importam.

Não é exatamente o que se encontra numa mesa de bar da Augusta, ou no coxa a coxa sob o calor do forró... Mas até que, por vezes, a gente até esbarra por aí.






quarta-feira, 12 de outubro de 2011

(Des)Acaso

E o acaso existe?

Ah, por vezes remamos... remamos... mantendo o ritmo para chegar de modo mais eficiente.
Usamos a estrategia mais curta e de maior rendimento...
      alcamos o maior leque de alternativas possivel...
tudo certinho!

E ai...

Por um acaso, cai um pote de ouro do ceu
ou a tempestade brota do solo

E paramos para pensar: como isso pode ser possivel? Ou, como tanta coisa impossivel pode ser possivel?

Ou sera...

Que nao temos a menor ideia da (im)possibilidade das coisas?

Ou melhor!

Que a impossibilidade se faz possivel em alguns momentos, e a possibilidade nos esmaga como impossivel em outros.

Tudo por um (des)acaso

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Luz

De uma alma despedaçada,
Desesperada
Desgovernada

Uma voz serena
Amena
Minimiza os espinhos

Sabedoria em confortar...

Acaricia as feridas
Alisa as arestas

O vento que derruba
as folhas do outono
Embala-me para a primavera

Uma brisa boa porvir

On the (sky)road

Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.
Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.
Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou, já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.
Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto.
Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.
Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.
Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.
Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade... Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".
Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.
Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.
Já chamei pela mamãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.
Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.
Não me mostre o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!
Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra SEMPRE!
Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das idéias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco q eu vou dizer:
- E daí? EU ADORO VOAR!
 
Clarice Lispector

Já confundimos tanto as nossas pernas
Que enfim adormeceram...
Só me resta voar!

Voemos então ao som de Sivuca =)

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Through


O que sera que acontece com algumas manhas? Aquela lista enorme de tarefas a cumprir naquele dia escapa do racional desidratado. E ele acaba absorvendo... nada. Depara-se com sua leveza insustentavel. Como se o inconsciente presente no sonho ainda driblasse a vigilia...

Ai vem a terrivel saudade...

De quem ou de que, afinal?

Quando estava do outro lado do portal, achava que era de ti. Achei que, assim que conseguisse ultrapassar os tropicos, isso acabaria.

Pois bem, estou por aqui. Do mesmo lado. Mas, incrivelmente, estes momentos persistem!

Abraco forte, para testar essa saudade ou, esta falta.
Nao passa!

Procuro contato de quem esta ausente. Um telefonema, uma mensagem, uma fumacinha que seja...

UFA!!!

Passou...

Doce ilusao acreditar na presenca de quem quer que seja para sustentar essa insuportavel leveza do Ser.


OK, onde esta mesmo a lista das tarefas do dia?

domingo, 2 de outubro de 2011

Dissimulados



Um segredo,
aquela palavra muda
que assim quer ficar


Virada, mostra-se
nas coincidências e
afinidades que procuramos.


Reflexo especular 
que repulsa nossa imagem


Mas é no abraço nu
que ela canta,
embala, aconchega...


No olhar terno,
a presença tímida


Cientes
e pacientes

domingo, 25 de setembro de 2011

Um Conto Chinês

... atentos para as vacas que caem sobre nossas cabeças!

Incrível a semelhança com as animações



"You do what you have to do"
Do you really have to do what you have to do?



Lost... and found

sábado, 17 de setembro de 2011

Crack!

Por mais que a gente cuide de algo que gosta muito, em um dado momento se encontra uma rachadura. Quanto mais estimado o objeto, mesmo a mínima das distorções pode atingir proporções gigantescas. Aos olhos alheios, nada mudou. Mas para quem aquele era precioso demais...

Fica estranho!

O que era puro afeto... não rola legal. Fica pegando naquela irregularidade. Aí, tentamos a "maquiagem":
"ah, nem foi tanto assim"
"tudo bem, foi só naquele instante, por um descuido. O que importa é a essência do objeto"
"faz parte... nada é perfeito mesmo"

Mas o que pega é que ERA perfeito. Como pode não ser mais, por uma rachadura TÃO pequena...

E aí, o que fazer? Quanto o que é QUASE perfeito vale a pena?

Invariavelmente, passamos a analisar. Listamos os pontos positivos... os negativos... como ficaríamos sem ele... como ficaríamos com ele. Para deliberar com calma, inevitavelmente afastamos o afeto: afinal, como julgar com as emoções à tona? Talvez, quanto mais se racionaliza o que não tem nada de racional, mais confusos e desconfortáveis ficamos.

Talvez seja necessário conviver com isso tudo. Impossível recuperar a imagem anterior, isso é fato.

Conviver
Experimentar
Tatear
Trocar
Deixar as aferências sensoriais assumirem o comando
Habituar-nos ao que está se transformando

Afastar-nos, de vez, dos porquês!!

Talvez...

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Papo furado

Da minha professora de pilates que acabou de se casar:

- Enfim vamos estrear nosso "Home Theater"! Meu noivo, ops, meu m-a-r-i-d-o... Como é difícil me acostumar a chamá-lo de marido!

Como é difícil começar a chamar alguém de namorado

tão difícil como passar a chamá-lo de noivo (isso ainda existe?)

depois, de marido

ex-marido

e voltar a chamar alguém de namorado... e assim vai.

É SEMPRE difícil! Níveis diversos de algemas para mostrar ao mundo uma segurança que, no fundo, ninguém tem e todos procuram. Isso porque talvez seja extremamente difícil encarar um relacionamento como de fato ele é: de limites imprecisos, diversos em suas particularidades, pouco concreto para permitir que o classifiquemos ou que o seguremos com as garras!

O afeto é surdo! Não escuta apelos ou conselhos ou regras. Seu movimento está na sua essência, no seu fogo interno. Talvez a grande ciência esteja em percebê-lo e adequar o nome ao seu modo; e não segurar sua força pelo nome.

domingo, 11 de setembro de 2011

Arrependimento

Para meu mestre Aristóteles, a ação (e não o pensamento) destina-se ao Bem. A felicidade seria o sumo Bem ou, a somatória de todos os bens. O que seria o Bem? O fim de uma ação justa, aquela em estreita conexão com o pensamento, feita mediante a reflexão sobre os meios que conduzem a ação.

Deste modo, para bem escolher, não se leva em consideração o resultado (fim) almejado, e sim os meios disponíveis naquele momento.

É um aprendizado. Quanto mais ações deliberadas deste modo, "melhor esculpidos" os fins conquistados e mais próximos estaremos da felicidade.

Mas nem tudo são flores...

Por vezes, agimos independente da nossa vontade. Forçados. Como quando opta-se por comprometer uma artéria nobre para extirpar um tumor. É uma ação involuntária. Causa dor.
"Por vezes é difícil julgar qual coisa se deve escolher ao preço de qual outra e o que suportar em troca de quê, e é ainda mais difícil perseverar nas resoluções, pois nas mais das vezes o que é esperado é penoso, e aquilo a que somos compelidos é vil; de onde há ou não louvor e censura a respeito de quem é compelido."

Outras, desconhecemos algum ponto que seria essencial no processo da deliberação. Ou, não conseguimos identificá-lo a tempo e só nos damos conta daquele ponto depois de ter agido. Como quando tratamos uma infecção com um antibiótico que traz uma reação alérgica naquele paciente. A crise alérgica foi suscitada por ignorância.

E onde fica o arrependimento nessa conversa de louco?

Aristóteles diz que quando nos arrependemos, o ato foi involuntário. Se não há arrependimento, o ato foi não-voluntário.

E por um acaso adianta nomear alguma coisa? O que importa se o ato foi involuntário ou não-voluntário?

Bom, se não há arrependimento, creio que não há aquela vontade de refazer tudo de novo, ou
1. o ato não voluntário foi bem deliberado, ou seja, o fim compensou o que foi deixado para trás. Sentimo-nos responsáveis pela ação que chega a ser louvável - apesar da dor pela perda.

2. ligamos o "foda-se" e não estamos nem aí para o resultado obtido. Foi circunstancial, acontece com todo mundo. Não nos sentimos responsáveis e pronto.

Se há arrependimento... Aí é foda. Dá vontade de voltar no tempo, fazer tudo de novo, e sabemos que, já que não conhecemos os "caminhos de minhoca", isso ainda não é possível.

Talvez o mais difícil seja discernir o que é a dor pela perda e o que é arrependimento, dado que são motivos e consequencias diversas de sentimentos próximos.

Acho que, no momento, estou arrependida. Fiz uma escolha sem conseguir enxergar direito as circunstâncias. A aflição era tanta, aferências diversas, não fui capaz. Eu queria voltar no tempo e fazer tudo de novo.

Mas o Filósofo de novo nos salva. As ações são frutos da razão aplicada às emoções. Como não há como matematizar as emoções, há que se fazer sempre um ajuste entre a razão e a natureza imprecisa do processo da escolha. Como um arqueiro que mira o alvo. Dificilmente o acerto é exato. Perdoamos a quem erra por pouco, assim como elogiamos a quem quase acerta.

"Ethica Nicomachea". Recomendo!!!

domingo, 28 de agosto de 2011

Cadê você?



O mundo gira louco
pouco sinto o tempo
O vento me atira para longe
e te esconde de mim


Meu grito mudo te chama
Acha que ouve mas não escuta
Procuro nosso tempo
Não encontro o lugar
Nele me procuro
Eu estava lá, sei que estava


Mas o vento me atira para longe
E a tempestade te esconde
Giro, louca,
pouco resta de mim

domingo, 21 de agosto de 2011

Trap

Já estamos cansados de ouvir que o amor acontece, aparece quando menos se espera, nos pega de surpresa, e tantos outros...

Por que será?

Quem está à procura, inevitavelmente lista uma série de características favoráveis e desfavoráveis. Ah, inteligente, sensível, motorizado, casa própria, emprego estável, sem vícios, que goste de crianças, poeta, que toca algum instrumento, companheiro de supermercado e de compras... Como qualquer coisa que procuramos:
- apartamento de 2 quartos, garagem, rua tranquila
- ou um caderninho de capa resistente, folhas destacáveis, levinho.
- guarda-chuva que só aparece quando chove...

Pode ser João, José, Mário (...?), edifício solar, cancun, riviera, caderninho marrom ou vermelho... 
Tanto faz, contanto que tenha o maior número de características procuradas.
Qualquer desvio torna-se um defeito. Dá até medo de conhecer melhor...

Mas quando não estamos procurando, não há lista pré-formada. Há afinidades, claro. Mas é o encanto que nos abduz.
Cada surpresa aumenta a lista de características que nem sabíamos que estávamos procurando. 
Qualquer desvio torna-se mais uma qualidade. Dá vontade de conhecer cada vez mais.


O olhar intencional, focado, objetivo, mais uma vez é o que nos cega e nos faz perder o que há de melhor. 


Foi assim que fugi! 


E foi na penumbra, terra de ninguém e do avesso que então me encontrou.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Ampulheta

Não há situação mais delicada do que informar ao paciente sobre uma doença grave. Ou, de um jeito genérico, conscientizar-se de que tudo que começa tem um fim.

Fases.

O tempo é implacável e nos lembra de que TUDO passa.

Por vezes, a reação é surpreendente. Meu avô vivia especulando sobre como seria seu fim: "como nunca fiquei doente, acho que sou muito fraquinho para aguentar uma gripe! Acho que qualquer resfriado me leva..." Até que ficou todo amarelinho e foi descoberto um câncer no pâncreas. Todos entraram em desespero, menos ele que me disse ao pé do ouvido: "Diga a eles que está tuuudo bem!" Relaxou. Já sabia, pelo menos, como iria. E ainda tinha uma vaga noção de quando terminaria.

Conheci outra senhora. Um século de vida! Lúcida de dar dó. Estava com um quadro agudo e necessitava de uma cirurgia com urgência. Pedimos uma avaliação clínica para nos certificar de que as condições clínicas permitiriam o procedimento. Os olhos dela brilharam: "Doutor, isso quer dizer que posso morrer durante a cirurgia? WOW!!!!!" Pronto. Tava decidido. Relaxou. Mas por pouco tempo - a cirurgia foi muito bem, ou seja, ela continuou viva e muito bem viva.

Mas na maioria das vezes, é bom demais viver! Quando colocam uma ampulheta ou uma contagem regressiva de soslaio, ou um "agente funerário" como do filminho abaixo, vem aquelas fases famoooosas (de tempo e identificação variável):

Negação
Raiva/ revolta
Negociação
Depressão
Aceitação


The Backwater Gospel from The Animation Workshop on Vimeo.


Acho que a confusão que se instaura no filme acima vem justamente do desespero frente à incerteza à flor da pele. Desespero/medo que permeia as fases supracitadas.

Entretanto...

Lembrar
1. O fim é certo.
2. Quando ou como acaba, é incerto.
3. Assim, a incerteza também é certa ou, inegável
4. Incerteza é incerteza.

Ou seja... pode-se ter uma doença grave e morrer atropelado no dia seguinte. Pode-se lamentar a distância do ente querido e, no dia seguinte, receber uma proposta de trabalho justamente para onde ele partiu.

Essa incerteza é a que nos pega. Mas, se for parar para pensar, é justamente ela que nos salva!

É só não meter os pés pelas mãos e antecipar o fim ou, a certeza.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

White House



Sempre tive tudo.
Uma boa família
Bons colégios
Amigos preciosos

Trabalho com que gosto,
e este nos faz bem.
Tenho até um amor,
outro maior do mundo

Não tenho uma medalha,
uma dor elegante.

Mas carrego uma dor surda
muda e cega
a que não se ousa mencionar
e que por vezes quer me roubar do mundo

Não sei de onde vem
nem para onde quer ir

Não tem para quem gritar
E nem quem a ouça, posto que é muda

Como a da saudade
de alguém que nem vi ou ouvi ou senti

E, por vezes, cutuca
machuca
traiçoeira, arisca,
não a encontro

Procuro...

Capturo, com uma pinça
como a pontada de uma agulha fina
nos pontos com maior terminação dolorosa

fibras finas

dor aguda

de algum modo preciso localizá-la


Acho que é a dor de viver.

sábado, 9 de julho de 2011

A revolução sanguínea - parte 2

"ciúme é um complexo de pensamentos, sentimentos e ações que se seguem às ameaças para a existência ou a qualidade de um relacionamento, enquanto estas ameaças são geradas pela percepção de uma real ou potencial atração entre um parceiro e um (talvez imaginário) rival" 
White, G. L. (1981)

Cabe salientar 3 aspectos:
1. A qualidade do relacionamento
2. A percepção de um real ou potencial rival - uma suspeita
3. O complexo de pensamentos, sentimentos e ações resultantes.

1. Quando o relacionamento está indo muito bem, o ciumento não consegue nele acreditar. Oras, impossível que os dois se gostem tanto... sempre vai sobrar um espacinho em que o amor não esteja presente (o passado e o futuro são ótimos e constantes exemplos, afinal, estão excluídos do presente!). Aí o próprio sujeito se perde do resto, pois, na identificação com o que ele acreditava ser o objeto do desejo do outro, algo vacila dentro do seu próprio ser.

2. Portanto, é neste espacinho imaginário que aparece esta "percepção". Não passa de uma suspeita, e não importa se o fato é real ou não... Assim que aflora, implica na sua automática repressão. O ciumento sofre tanto com a suspeita quanto com a insistência ridícula em se perturbar com algo absurdo. Um amor sem ciúme talvez fosse sinal de um ciúme bem recalcado pelo sujeito (o que se observa na política familiar e social).

3. Posta a incapacidade da desconstrução da suspeita, segue-se o complexo de pensamentos, sentimentos e ações resultantes. Os pensamentos e sentimentos ficam perdidos nos giros cerebrais. Impossível racionalizá-los, já que partem de uma premissa... inexistente!
Talvez só seja possível identificar e isolar as ações - desde a frigidez (Bentinho) à vingança (Othelo).

Ou...

Um silêncio de algumas horas...

O ciúme, ou a revolução sanguínea

Começa com uma aferência que nem sabemos de onde vem, e ninguém imaginaria que arrebataria - se soubesse do estrago que poderia suscitar, com certeza não faria...

É um desconforto retroesternal (no meio do peito, lá no fuuuundo) difuso, mas não uniforme. Como se uma revolução se passasse entre as hemácias, os neutrófilos, linfócitos, plasma. Todos em guerra e correndo em direções variadas. Acho que por isso se passa nesta região - é onde se localizam os grandes vasos.

Segue por uma alteração imediata nos músculos faciais. O que antes era só sorrisos, acaba por paralisar. Não há movimento possível. Até se tenta alguma contração voluntária, mas não se ativa nenhum complexo actina-miosina.

O rebuliço (agora precordial) soma-se às imagens e caraminholas que correm nas curvas do pensamento. O sinergismo é impressionante, eleva-se à enésima potência, e as glândulas lacrimais são ativadas. Parece que a atenção, a percepção dos movimentos e discursos alheios ficam aguçadas e à espreita. Qualquer brecha é estopim para uma saraivada de tiros precisos, ferinos, carregados de veneno. O alvo nem sempre tem a ver com o que desencadeia todo esse tormento. Tem a ver com o que mais afeta o outro. O ponto fraco. Ou, o que achamos ser o ponto fraco...

Trata-se de uma nuvem cinzenta em que a dor é tanta para todos os envolvidos, e que mal se identifica o que se tem de mais importante. O sentimento - nem se ousa falar amor aqui, moralmente não combina com coisa ruim, mas é ele mesmo! - é que faz aflorar essa dor de modo proporcional. A dor [que faz (ativo) ou não (passivo) atirar no outro] é tão grande quanto o sentimento. Talvez não mais ocorra quando o sentimento arrefece.

Quem se sente machucado nem imagina o quanto já machucou o outro... afinal, como já disse, essa revolução sanguínea ocorre com aferências que os próprios envolvidos, inconscientemente, pretendem subestimar.

Ruinheira total. Mas faz parte, infelizmente... Nada mais humano que admiti-lo, e, quem sabe, colocá-lo como objeto de estudo. Afinal, é o que o homem moderno e pós-moderno faz com tudo que o ameaça.

Mas será que este distanciamento tbém não arrefece o amor?

Sejamos humanos! A dor faz parte da cura!

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Um amor assim tão delicado


"Pois a mesma prova também nós utilizaremos a respeito do Amor, de que ele é delicado. Não é com efeito sobre a terra que ele anda, nem sobre cabeças, que não são lá tão moles, mas no que há de mais brando entre os seres é onde ele anda e resite. Nos costumes, nas almas de deuses e de homens ele fez sua morada, e ainda, não indistintamente em todas as almas, mas da que encontre com um costume rude ele se afasta, e na que o tenha delicado ele habita."

Platão, "O Banquete"

... e com delicadeza, aprendo a cuidá-lo

domingo, 12 de junho de 2011

Cheek to cheek



De onde veio, não sei
Para onde vou, muito menos

Enfim deixo-me levar...

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Desvio, desvario, caminho sem volta

Agora corre nas minhas veias,
nas minh'ocas pensantes,
aquece minhas vísceras
e esvaio-me pelas pernas.

Como aquela peça do quebra-cabeças de cor e desenho diverso que encaixa direitinho ao meu lado, desliza que nem percebo, e compõe meu lar

Nos meus sonhos, são teus os (a)braços dos deuses
meu tempo mais vibrante é o teu
teu semblante, a mais nítida e constante imagem


E a tua ausência... nem imagino!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Fincar o presente

Stop all the clocks, cut off the telephone.
Prevent the dog from barking with a juicy bone,
Silence the pianos and with muffled drum
Bring out the coffin, let the mourners come.


Let aeroplanes circle moaning overhead
Scribbling on the sky the message  He  is  Dead.
Put crepe bows round the white necks of the public doves,
Let the traffic policemen wear black cotton gloves.


He was my North, my South, my East and West
My working week and my Sunday rest,
My noon, my midnight, my talk, my song;
I thought that love would last forever: I was wrong.


The stars are not wanted now; put out every one,
Pack up the moon and dismantle the sun,
Pour away the ocean and sweep up the woods;
For nothing now can ever come to any good.
W. H. Auden - Funeral Blues


O mundo acabando,
podem ficar tranquilos.
Acaba voltando
tudo aquilo.


Reconstruam tudo
segundo a planta dos meus versos.
Vento, eu disse como.
Nuvem, eu disse quando.
Sol, casa. rua,
reinos, ruínas, anos,
disse como éramos.


Amor, eu disse como.
E como era mesmo?
P. Leminski - Segundo Consta

A única certeza que temos é que todos morrem. Ninguém escapa. Será que é por isso que fica tão difícil pensar no fim?
É como uma sombra, assombra qualquer momento.
Não conseguimos ignorá-lo
Escondê-lo
Desviar...

Não há como justapor o presente existente e o futuro fim. Por que insistimos nisso?
O contraste entre o presente (vivo e intenso), e o fim, é abrupto. A dor, infundada e inevitável, é arrebatadora. Funeral Blues.


É preciso fincar o presente. Afinal, o passado perde a importância por conta do esquecimento e o preenchimento das lacunas com falsas suposições. E o futuro... jogamos com as probabilidades, e isso (nas ciências da vida) diverge muito do real, por maior e mais exata que seja a aproximação. Também perde a importância.

O medo, a raiva, a ansiedade, é que transformam passado e futuro em importância e conteúdo.

O fim está posto. Que saia das sombras e se localize em suas devidas coordenadas. Aquelas que chegam depois de tudo... no fim. Ponto que torna Tudo, passado.

E o passado - como era mesmo?