Divorciada. 2 filhos. Excelente profissional. Sem frescuras. Amiga. Inteligente. Linda. Porreta. A idade? Ninguém sabe e ninguém advinha. Cheio de homem ao redor, mas não se apaixonava há tempos. E a ternura lhe é peculiar, quer sim alguém "para compartilhar a vida".
Ela conheceu um cara que lhe deu a maior canseira! Conversavam, amassos deliciosos, e naaaada. Intrigava - será que o cara era gay? Mas não levava jeito, a pegada era boa.
Depois de meses, enfim foi visitá-lo - ele não morava em SP. Conheceu o lar e o entorno do rapaz: casa, amigos, plantação de favas, MÃE... e enfim certificou-se de que o cara realmente não era gay. Compartilharam a vida dele naqueles 3 dias, como o que ela tto procurava.
Ela se apaixonou! Se era verdade ou não, agora não dá para saber. Mas ficou completamente envolvida.
Voltou para casa, e me ligou irritada pq queria parar de pensar no cara. Aquilo estava atrapalhando sua vida, suas tarefas, trabalho... Afinal, estava hiper confusa: o cara não dava certeza de nada.
- Onde ela se encaixava na lista de prioridades dele?
- Existiam prioridades na vida dele? Amigos e MÃE eram importantes? Ela os conhecia, logo, ela era importante?
- Pô, se ela era importante, por que ele não a procurava? Não faziam planos? Onde ela se situava na vida dele?
Já passei por isso. Mas do outro lado. Cobravam-me "um lugar".
Por que é tão difícil confiar no que o casal experiencia? Ou seja, por que a dúvida de que é bom demais ficar com o outro? Que não há aquele comichão de nem querer ver o cara no dia seguinte? Quando se dorme de conchinha por mais que 15 minutos e é gostoso? Quando se tem vontade de contar todas as besteiras que se passam pela cabeça? E nem se tem vergonha de mostrar as inseguranças, fraquezas, bobeiras, ranhetices e manias, aliás, nem se pensa nelas, simplesmente surgem e passam despercebidas entre um olhar, uma palavra e um gesto...
Não há lugar. Não se coloca demanda ou funções na relação. Não se denomina o outro como "namorado" ou "marido" ou "amigo"... Não há passos do tipo: conhecer os amigos, a família, os filhos, a MÃE... A casa, o telefone, o trabalho, o habitat.
Há tanta gente presa nisso tudo sem afeto... Uma vida de deveres, o que se chama de "responsabilidade". Como se isso bastasse para segurar qualquer coisa. É uma espécie de materialização do afeto: os atos, as funções, os nomes, a aliança no dedo direito ou esquerdo, o contrato... Os "filhos" da relação. Mas não se pode confundir com o amor, o que gerou (se gerou) tudo isso.
Mas há pior! Há quem pegue os "filhos" que nem foram gerados pela relação, mas pela própria cabeça. Uma esporulação. Impõe uma série de esporos (atos/funções/nomes/planos) advindos pela expectativa do que seria um casamento perfeito, na relação. Um castelo de cartas sobre uma embarcação flutuante...
Como sempre, inspirada por Foucault, vejo a verdade na ética dos afetos como fundamental.
Nesta trilha, de novo, há que se confiar na essência da experiência vivida entre o casal. Só.
Minha amiga me ouviu, entre o olhar virando para o teto, os gestos, o brilho da pele... Depois de 2 dias me procurou novamente:
"- Quando vc me disse aquilo tudo, a ficha caiu. Minhas expectativas e procura pelo amor, fizeram-me encaixá-lo no meu "anúncio de jornal": fiz preencher todos os pré-requisitos do que procuro. Entretanto, esta certeza do afeto, da confiança, do conforto, que fez vc brilhar enquanto falava... não temos. Não vivemos isso naqueles 3 dias, embora eu tenha feito parte da vida dele."
Acredito que quando já conquistamos o nosso habitat, ou, a infraestrutura do que consideramos uma vida saudável - basicamente família e trabalho - não nos cabe encaixar quem se ama para enroscá-lo a ponto de garantir nossa presença nas nossas vidas. Há que se confiar no afeto, naquela sensação de que a pessoa está ao nosso lado. Desde sempre e para sempre.
O resto... é resto.
Ainda te convenço a pensar assim ;)
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